Ia começar este texto falando da vida de casado, ou da vida acasalado, ou simplesmente da vida a dois, com ou sem compromisso. Uma vida de casal, tal como a vida em geral, é feita de altos e baixos.
No casamento, os momentos baixos costumam dar filmes mais interessantes e “Até que a vida nos separe” acredita nisto. A série concentra-se nas dificuldades da vida de casal tendo, ironicamente, como pano de fundo uma agência que organiza casamentos.
A família central desta série portuguesa, agora disponível na Netflix, são os avôs Luísa e Joaquim, os pais Vanessa e Daniel e os filhos Rita e Marco.
Com frequentes flahsbacks, “Até que a vida nos separe” salta dos anos 60 para os 90, para depois voltar à atualidade para mostrar como é difícil construir uma relação, manter uma relação ou formalizar uma relação.


Cada episódio começa com um novo casamento – que nem sempre se concretiza – e que, desde as primeiras frases dos noivos deixa a impressão de que algo está errado naquela relação.
Mas as histórias de amor mais complicadas são as dos protagonistas, a família Paixão. A avó sofre de Alzheimer e – além de citar as estações e apeadeiros portugueses por ordem alfabética – de vez em quando foge de casa e perde-se num comboio, ou troca a identidade do seu genro. O avô demonstra por ela amor incondicional. Apesar das dificuldades e da doença, ambos representam o casal mais estável e apaixonado da série, embora a avó Luísa viva noutro mundo por causa da sua doença.
Os pais, Vanessa e Daniel, estão prestes a divorciar-se quando a série começa. Mas os criadores de “Até que a vida nos separe” optam por contar as origens da história de amor, regalando-nos com flashbacks que são outras tantas oportunidades de recriar momentos do século passado, com as suas roupas, músicas e tantos outros pormenores, sempre muito bem recriados.
A geração atual, os irmãos Rita e Marco, representam bem os jovens de hoje, a viverem com os pais, indecisos, à procura de um sentido para a vida, ainda antes de procurarem uma relação.
É pouco o que afasta “Até que a vida nos separe” do formato de uma telenovela em poucos episódios. Os flashbacks são um dos elementos essenciais para criar um “espírito Netflix”, mas há também momentos de criatividade interessantes, com sonhos, jogos de vídeo e muitas referências musicais e cinematográficas.
Esta escolha interessante nem sempre é muito inteligente e acaba por ser, por vezes, repetitiva.
Havia muito território para cobrir, e os criadores da série parece que, em alguns episódios, fizeram uma manta de retalhos de ideias para tentarem encaixá-las todas nos oito episódios.
É positivo o facto de o realizador Manuel Pureza e os produtores do programa terem decidido apresentar-nos os membros da família gradualmente, de forma a que as histórias individuais fossem reveladas sem esperar pelo final.
O que acontece na vida das personagens principais é revelado no primeiro episódio, mas é só a partir do segundo ou terceiro que entram em jogo os factores complicadores e que as relações entre eles são reveladas.
“Até que a vida nos separe” é uma série criada e escrita por Hugo Gonçalves, João Tordo e Tiago Santos e produzida pela Coyote Vadio. A série estreou a 3 de fevereiro de 2021, na RTP1, e concluiu a transmissão a 31 de março de 2021.
Tornou-se na segunda série portuguesa a ser comprada pela Netflix depois de “Glória”, ficando assim disponível em 198 países através da plataforma de streaming.

“Até que a vida nos separe” de Manuel Pureza, com Rita Loureiro, Rita Poças, Dinarte Branco, Luís Lobão, Madalena Almeida, Diogo Martins, Henriqueta Maya, José Peixoto, José Condessa, Teresa Tavares e Albano Jerónimo.

Raúl Reis